Por Cesar Furtado de Carvalho Bullara
Prof. de Comportamento Humano nas Organizações
ISE – Instituto Superior da Empresa
e-mail: cesarbullara@ise.org.br
A efetividade de todo este processo está em que não nos fixemos somente nos aspectos externos da mudança, naquilo que aparece, na estrutura formal da organização. Se o processo de mudança não tem como resultado a mudança das cabeças e da sua forma de ver a organização, a sua eficácia será pequena ou até mesmo inexistente. Isso explica o fracasso de muitas tentativas de reestruturação. Não basta mudar um organograma, é fundamental mudar as pessoas. Aqui reside toda a dificuldade!
Parece-me necessário situar o coaching dentro deste contexto. Algumas organizações estão implantando um processo de coaching sem capacitar corretamente as pessoas para enfrentarem todas as dificuldades que supõe. O coach tem que possuir, além da preparação técnica, a capacitação antropológica. E normalmente, aqui se encontra o seu calcanhar de Aquiles.
O coaching não é somente uma técnica, mas um processo que deve ser entendido desde o ponto de vista antropológico.
Em primeiro lugar, é importante saber que todo processo de mudança de atitudes e aquisição de competências tem 3 barreiras a serem transpostas: a do conhecimento, a da vontade e a dos hábitos.
Comecemos pela primeira: a barreira do conhecimento. Não é possível mudar sem saber o que temos que mudar. Para vencer este primeiro obstáculo, uma ferramenta indispensável são os feedbacks e as avaliações de resultado. Dependendo da forma como são aplicadas estas duas ferramentas, o processo de coaching pode ficar bastante comprometido. Se não formos pessoas capazes de realizar adequadamente tais tarefas, não criamos o ambiente de confiança necessário para conduzir um processo desse tipo. A geração de um clima defensivo é a pior coisa que pode acontecer. Como as pessoas mudarão em algo que não entendem como sendo um problema ou se não aceitam o feedback que lhes damos? Principal dica para vencer esta barreira: dar um feedback construtivo, centrando-se em aspectos que dependem da pessoa, descrevendo comportamentos mas sem emitir juízos de valor e ao mesmo tempo, mostrando as conseqüências dos comportamentos.
Vencida a barreira do conhecimento, torna-se prioritário abrir os caminhos da vontade. Não é suficiente dar-se conta de que precisamos desenvolver algumas competências. O saber em si não gera a vontade de mudar. Chegamos ao cerne do problema: a liberdade das pessoas. Alguns nunca mudarão porque lhes falta a vontade de mudar: não querem mudar. Este é um elemento distintivo importante! Também é verdade que pessoas de vontade fraca não conseguem sustentar grandes esforços de mudança. Não digo que não possam mudar; digo que sua capacidade de mudança é limitada pela força da sua própria vontade. E se não fortalecem a sua vontade, nunca realizarão mudanças profundas. Aqui a dica mais importante se centra em utilizar-se do conhecimento adquirido pelo “coacheado” para mover sua vontade, ajudando-lhe, até onde podemos, a que queira mudar. Para isso, temos que identificar quais são as razões da sua resistência a mudar: auto-estima ou caráter.
Por fim, temos que romper a barreira dos hábitos. Todo hábito é uma disposição fortemente arraigada, quer seja como efeito de uma inclinação ou tendência espontânea que possuímos, quer seja como conseqüência de decisões livres tomadas anteriormente. Portanto, de acordo com o Prof. Juan Antonio Pérez López do IESE Business School, na constituição dos nossos hábitos de comportamento temos a concorrência de dois aspectos: o espontâneo, que diz respeito ao grau de atratividade que uma ação possui para nós e o racional, que faz referência à conformidade da ação com relação ao desenvolvimento da nossa personalidade.
A motivação espontânea é aquela que entra em ação quando pensamos naquelas tarefas que mais gostamos ou nas atividades que mais nos descansam. Já a motivação racional trata de mostrar a conveniência de realizar uma ação não pelo que vamos desfrutar, mas pelo que devemos fazer, movidos pelo sentido do dever e pela noção do que é certo fazer, independentemente de sentir-nos inclinados ou não.
Para ultrapassar esta última barreira, o coach deve ter presente a dinâmica da atuação humana e do desenvolvimento dos hábitos de comportamento. Nenhum processo de coaching se torna efetivo se não tem como resultado a incorporação de novos hábitos e a eliminação de outros. Para alcançar este resultado, o coach tem que saber como conduzir o coacheado pelos caminhos da motivação racional, fazendo com que esta influa na motivação espontânea até tal ponto que adquira uma nova inclinação. Isso torna-se evidente quando falamos de competências como delegação e trabalho em equipe. Alguém que necessite desenvolver tais competências se encontra perante a barreira da sua motivação espontânea de, por exemplo, não delegar. Se quiser adquirir capacidade de delegação terá que utilizar-se da motivação racional, pois a sua motivação espontânea lhe inclinará a não delegar. Com o exercício da delegação e contando com o tempo, a motivação racional irá influindo positivamente na motivação espontânea provocando a sua mudança de tendência.
Como vemos, todo processo de coaching é um processo de mudança pessoal. Portanto, ser o coach de uma pessoa implica conhecê-la em profundidade para ajudá-la a romper suas próprias barreiras. Não podemos ajudar a alguém sem tomar contato com a sua realidade e o seu potencial; esta é a primeira tarefa de qualquer coach. Ignorar qualquer destas 3 barreiras traz como conseqüência ineficácia, frustração e sensação de perda de tempo.